I. Introdução: Um Encontro de Mundos na Amazônia
A história da imigração japonesa no Brasil é um capítulo fascinante da formação cultural e econômica do país, marcado pela chegada emblemática do navio Kasato Maru em Santos, em 18 de junho de 1908. Essa vinda de imigrantes foi impulsionada por uma confluência de interesses recíprocos: o Brasil, recém-saído do regime escravista, buscava mão de obra para suas vastas plantações de café, especialmente em São Paulo e no norte do Paraná. Simultaneamente, o Japão, em meio às transformações sociais e econômicas da Era Meiji (iniciada em 1868), enfrentava uma superpopulação rural e crises econômicas agravadas pelo Grande Terremoto de Kantō em 1923 e pela crise mundial de 1929, que intensificavam a necessidade de uma política de emigração para aliviar tensões sociais. Apesar dos desafios iniciais, que incluíam barreiras linguísticas e culturais, condições de trabalho árduas e períodos de discriminação, o Brasil se tornou o lar da maior população de descendentes de japoneses fora do Japão.
Contudo, dentro dessa vasta narrativa, emerge um fluxo migratório com características singulares: a jornada japonesa para a Amazônia. Enquanto a maioria dos imigrantes se concentrava no Sudeste, a imigração para o Pará, e mais especificamente para o município de Tomé-Açu, iniciou-se significativamente mais tarde, em 1929, 21 anos após o desembarque do Kasato Maru. Em 16 de setembro de 1929, um grupo pioneiro de 43 famílias, totalizando 189 pessoas, desembarcou em Belém, com o destino final de Tomé-Açu. Essa diferença temporal e de destino sugere que a comunidade japonesa na Amazônia desenvolveu uma identidade e um modelo agrícola distintos em comparação com seus compatriotas no Sul do país. As adversidades enfrentadas e as inovações subsequentes, como o Sistema Agroflorestal de Tomé-Açu (SAFTA), forjaram uma resiliência e autossuficiência únicas, moldando uma identidade nipo-brasileira profundamente ligada ao ambiente amazônico e aos seus desafios e oportunidades agrícolas específicos.
Hoje, Tomé-Açu se destaca como o epicentro dessa transformação. A cidade é reconhecida pela forte influência da imigração japonesa e por seu modelo agrícola inovador, tornando-se um dos maiores polos de agrofloresta sustentável no Brasil, com a exportação de produtos como cacau, açaí e pimenta-do-reino para o mundo. Este município é um testemunho vivo da resiliência, inovação e notável capacidade de adaptação da comunidade nipo-brasileira, que conseguiu transformar uma região de densa floresta amazônica em um exemplo de desenvolvimento econômico, ecológico e social. A história oficial, frequentemente centrada na chegada do Kasato Maru, ganha uma camada de nuance ao se considerar que a presença japonesa em solo brasileiro antecede os acordos formais, com o registro de quatro náufragos do barco Wakamiya Maru em 1803. Embora não diretamente ligados à migração para o Pará, esses “pioneiros ocultos” indicam uma interação precoce e menos organizada, sugerindo que os projetos de imigração formal, como o de Tomé-Açu, podem ter se beneficiado de percepções ou conhecimentos pré-existentes sobre o Brasil, acrescentando uma profundidade histórica que vai além da simples narrativa do “primeiro navio”.
II. A Chegada e a Escolha Inusitada: Por Que o Pará e Tomé-Açu?
A decisão de direcionar imigrantes japoneses para o distante estado do Pará, e especificamente para a inóspita região de Tomé-Açu, não foi um acaso, mas o resultado de complexas negociações e avaliações técnicas. A pressão demográfica e as crises econômicas no Japão pós-Era Meiji, impulsionadas pelo Grande Terremoto de Kantō em 1923 e pela crise mundial de 1929, tornaram a emigração uma política governamental essencial para aliviar a tensão social e a pobreza rural. Do lado brasileiro, a abolição da escravidão criou uma lacuna significativa na força de trabalho agrícola, levando o país a buscar imigrantes para suas lavouras, não apenas café, mas também para o desenvolvimento de outras regiões e culturas.
Após 139 dias de pesquisa intensiva, a equipe de Hachiro Fukuhara elegeu uma área promissora no município do Acará, situada entre o rio Acará e seu afluente Acará Pequeno, como o local ideal para a colonização japonesa. Diversos fatores foram decisivos para essa escolha. O governo do Estado do Pará, sob a liderança de Dionísio Bentes, demonstrou grande entusiasmo e se comprometeu a ceder, gratuitamente, 500.000 hectares de terras para a iniciativa. A motivação do governo paraense não se limitava à busca por mão de obra; representava um cálculo estratégico para a ocupação territorial e o desenvolvimento de uma vasta região despovoada da Amazônia. Os imigrantes japoneses eram vistos não apenas como trabalhadores, mas como colonos que trariam conhecimento agrícola e estabeleceriam comunidades permanentes, consolidando a presença econômica e o controle sobre uma área de fronteira.
As impressões relatadas por Hachiro Fukuhara também foram cruciais. Ele descreveu o Pará de forma muito positiva, destacando um clima que, embora úmido, era considerado adequado para os japoneses, semelhante ao do Japão. O solo foi elogiado como rico e fértil, permitindo que os colonos se tornassem proprietários de terras com um capital limitado. Fukuhara também ressaltou a intensa necessidade de desenvolver o “sertão” paraense, a hospitalidade da sociedade local e a facilidade de transporte proporcionada pela vasta rede de rios e igarapés. Notavelmente, ele afirmou a ausência de preconceito racial no Pará, um fator que, se verdadeiro na época, contrastaria com as realidades enfrentadas em outras partes do mundo. Essa visão inicial otimista dos exploradores japoneses, pautada pela aparente ausência de preconceito racial e pela fertilidade do solo, contrastaria drasticamente com as duras realidades e desafios que seriam enfrentados pelos imigrantes, indicando uma possível desconexão entre a percepção inicial e as complexidades da colonização amazônica.
A coordenação da chegada dos imigrantes ficou a cargo da Companhia de Imigração Nantaku (Companhia de Colonização Sul-Americana S.A.), que obteve a concessão de um milhão de hectares para acomodar os colonos em Tomé-Açu. Entre 1929 e 1937, a Nantaku coordenou a chegada de 2.104 japoneses à região. Apesar do otimismo oficial, a escolha de Tomé-Açu não foi unânime. Críticos da época sugeriam que Bragança, mais próxima de Belém e com terras já “afeitas à lavoura”, seria um local mais apropriado para o assentamento dos imigrantes, apontando para os desafios logísticos inerentes à distância de Tomé-Açu dos principais mercados. A severidade das condições econômicas no Japão, detalhada pelas crises da década de 1920, incluindo o Grande Terremoto de Kantō e a crise mundial de 1929, aprofundou a motivação de “superpopulação e falta de empregos”. Essa pressão econômica extrema no país de origem provavelmente tornou a perspectiva de terras gratuitas e uma nova vida na Amazônia, mesmo com suas incertezas, uma opção mais aceitável e, para muitos camponeses empobrecidos, talvez desesperadora. Isso sugere que os fatores de repulsão do Japão eram tão fortes que provavelmente ofuscaram alguns dos riscos conhecidos da colonização amazônica, gerando uma maior tolerância à adversidade entre os imigrantes.
Tabela 1: Linha do Tempo da Imigração Japonesa no Pará e Tomé-Açu
Ano | Evento |
1803 |
Primeiros japoneses (náufragos do Wakamiya Maru) pisam em solo brasileiro (incidentalmente). |
1868 |
Início da Era Meiji no Japão, motivando política de emigração. |
1908 |
Chegada do Kasato Maru em Santos, marco inicial da imigração japonesa no Brasil. |
1920s |
Crises econômicas no Japão (Grande Terremoto de Kantō, crise mundial de 1929) intensificam a emigração. |
1925 |
Missão Ashizawa investiga terras no Pará. |
1926 |
Missão Fukuhara chega a Belém, escolhe área no Acará/Tomé-Açu; Governador Dionísio Bentes oferece 500 mil hectares. |
1929 (16 de setembro) |
Desembarque do primeiro grupo de 43 famílias (189 pessoas) em Belém, destinadas a Tomé-Açu, sob coordenação da Nantaku. |
1929 (27 de outubro) |
Chegada da segunda leva de imigrantes pelo Santos Maru, com parte destinada ao Acará. |
1930 |
Chegada da terceira leva pelo Buenos Aires Maru; colônia cultiva arroz e hortaliças, enfrenta crise econômica e doenças tropicais. |
1931 |
Fundação da Cooperativa de Hortaliças em Acará (precursora da CAMTA) |
1933 |
Introdução da pimenta-do-reino de Cingapura pelo Dr. Makinosuke Usui. |
1937 |
Fim do primeiro período de imigração para o Pará. |
1942 |
Rompimento das relações diplomáticas Brasil-Eixo; Tomé-Açu torna-se campo de concentração para japoneses. |
1949 |
Cooperativa de Hortaliças transformada em Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu (CAMTA). |
1950s |
Tomé-Açu se torna o maior polo de produção de pimenta-do-reino, Brasil líder mundial (“diamante negro”). Início do segundo período de imigração (1952-1962). |
1957 |
Início tímido da disseminação do fungo Fusarium nos pimentais. |
Final dos anos 60 |
Crise da pimenta-do-reino devido a doenças (fusariose). |
Década de 70 |
Adoção do Sistema Agroflorestal de Tomé-Açu (SAFTA) como alternativa à monocultura. |
1987 |
Implantação da Agroindústria de Frutas Tropicais da CAMTA. |
2009 |
80 anos de imigração japonesa na Amazônia. |
2018 |
Cacau cultivado com SAFTA obtém certificação de Indicação Geográfica (IG). |
2019 |
90 anos da Imigração Japonesa na Amazônia. |
III. Os Primeiros Anos: Desafios, Adaptação e a Luta pela Sobrevivência
A chegada dos imigrantes japoneses a Tomé-Açu em 1929 marcou o início de uma luta árdua contra um ambiente amazônico implacável. As realidades da floresta tropical contrastavam drasticamente com as expectativas iniciais, apresentando desafios que testaram a resiliência dos colonos ao limite. Doenças tropicais, em particular a malária, foram uma ameaça constante e devastadora. Há registros de mortes, como a de Hetsuhiko Oyama, de 22 anos, em 1937, vítima da doença. O clima tórrido e úmido, a ausência de infraestrutura e o isolamento contribuíam para um cenário de adversidade generalizada.
Um evento paradoxal que marcou esse período foi a Segunda Guerra Mundial. Após o rompimento das relações diplomáticas entre Brasil e os países do Eixo em 1942, Tomé-Açu foi transformada em um campo de concentração para imigrantes japoneses. Essa medida de segurança, embora repressiva, teve um efeito inesperado: a concentração dos japoneses na colônia permitiu reavivar a comunidade, que estava quase extinta em 1941. O isolamento e a adversidade compartilhada fortaleceram os laços internos e a autossuficiência, preparando o terreno para a próxima fase de desenvolvimento.
IV. A Reinvenção Agrícola: Do “Diamante Negro” à Agrofloresta Sustentável
A história agrícola de Tomé-Açu é um testemunho da capacidade de reinvenção diante da adversidade. Após os fracassos iniciais com o cacau e as dificuldades econômicas, um ponto de virada crucial ocorreu na década de 1930 com a introdução da pimenta-do-reino. O Dr. Makinosuke Usui trouxe 20 mudas da especiaria de Cingapura, das quais apenas duas sobreviveram, mas essas poucas plantas se revelaram um potencial econômico gigantesco para o Pará.
Em 1949, a cooperativa agrícola pioneira, inicialmente focada em hortaliças, foi transformada na Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu (CAMTA), um marco fundamental para a organização e o desenvolvimento da colônia. Após a Segunda Guerra Mundial, a demanda global por alimentos, incluindo a pimenta-do-reino, cresceu exponencialmente, impulsionando a expansão da monocultura na região. A partir dos anos 1950, Tomé-Açu se consolidou como o maior polo de produção nacional de pimenta-do-reino, elevando o Brasil à liderança mundial na exportação dessa especiaria. A pimenta-do-reino, que trouxe prosperidade e riqueza à região, foi carinhosamente apelidada de “diamante negro”.
No entanto, essa era de ouro da monocultura não duraria para sempre. No final da década de 1960, uma nova crise se abateu sobre Tomé-Açu: doenças letais, em especial o fungo Fusarium, começaram a dizimar vastas plantações de pimenta-do-reino, que já se manifestava timidamente desde 1957 e se intensificou nos anos 70, aliada à queda de preços. Essa vulnerabilidade da monocultura forçou a comunidade a buscar uma nova abordagem.
A trajetória agrícola de Tomé-Açu ilustra um padrão de inovação contínua, impulsionada pela necessidade. Cada crise, em vez de ser um ponto final, tornou-se um trampolim para a busca de soluções mais robustas e adaptadas. A resposta da comunidade foi o desenvolvimento e a adoção do Sistema Agroflorestal de Tomé-Açu (SAFTA) na década de 1970. Esse modelo inovador, concebido pela própria comunidade nipo-brasileira, consistiu no plantio consorciado de espécies frutíferas e florestais dentro dos pimentais decadentes. A inspiração para essa prática veio da observação dos agricultores sobre os nativos das margens do rio Acará, que já cultivavam diversas espécies em conjunto. Essa é uma profunda transformação: de tentar impor modelos agrícolas externos à Amazônia, a comunidade passou a aprender e adaptar o conhecimento ecológico indígena, transformando-se de uma força que inicialmente lutava contra o ambiente para uma que prospera em harmonia com ele.
O SAFTA representa um modelo exclusivo de agricultura conservacionista dos recursos hídricos e da biodiversidade amazônica, garantindo sustentabilidade econômica, ecológica e social. Ele permitiu a diversificação da produção para além da pimenta-do-reino, incluindo frutas tropicais como cacau, açaí, cupuaçu, maracujá e acerola, além de óleos nobres, borracha natural e madeiras legalizadas. A produção de cacau, em particular, progrediu significativamente, com o Pará se tornando o maior produtor do país e o cacau de Tomé-Açu obtendo a certificação de Indicação Geográfica (IG) em 2018, sendo exportado para empresas japonesas.
O sucesso econômico da colônia não pode ser desassociado da sua notável capacidade de organização coletiva. A Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu (CAMTA), desde suas origens como cooperativa de hortaliças, emergiu como o pilar central dessa transição. A CAMTA não apenas organizou a produção inicial, mas também liderou a adoção do SAFTA, impulsionou a agroindústria com a implantação da Agroindústria de Frutas Tropicais em 1987, e expandiu os mercados, processando anualmente cerca de 3,5 mil toneladas de polpa de frutas e absorvendo a produção de 2.800 produtores. Atualmente, a CAMTA movimenta 19,3 milhões de reais e gera em torno de 10.000 empregos, exportando seus produtos para diversos países como Japão, Estados Unidos, Argentina e Alemanha. A cooperativa também patenteou o uso do SAFTA, garantindo a certificação de sustentabilidade de seus produtos. A força da organização coletiva, exemplificada pela CAMTA, demonstra que a coesão social foi um pré-requisito para a prosperidade econômica.
A Tabela 2 sumariza as principais contribuições agrícolas e econômicas da comunidade de Tomé-Açu, ilustrando a evolução e o impacto de suas inovações.
Tabela 2: Principais Contribuições Agrícolas e Econômicas de Tomé-Açu
Período | Cultura/Inovação |
1929-1930s |
Arroz e Hortaliças (subsistência e comercialização inicial). |
1930s |
Cacau (tentativa inicial, fracasso). |
1933-1960s |
Pimenta-do-Reino (“Diamante Negro”, monocultura, Brasil líder mundial em exportação). |
Final dos anos 60 |
Crise da Pimenta-do-Reino (fusariose). |
Década de 70 em diante |
Sistema Agroflorestal de Tomé-Açu (SAFTA) (modelo sustentável, consórcio de frutíferas e florestais, conservação da biodiversidade). |
1987 em diante |
Agroindústria de Frutas Tropicais da CAMTA (processamento de polpas, amêndoas de cacau, óleos vegetais). |
Atualidade |
Faturamento da CAMTA (R$ 19,3 milhões em 2009), Geração de Empregos (10.000 empregos), Exportação (Japão, EUA, Argentina, Alemanha), Certificação IG para cacau. |
V. O Legado Vivo: Cultura, Comunidade e Futuro
O impacto da imigração japonesa em Tomé-Açu transcende a esfera econômica e agrícola, manifestando-se vibrantemente na fusão cultural que define a comunidade. A disciplina e o planejamento, traços culturais frequentemente associados aos japoneses, não se manifestaram apenas na organização agrícola, mas se transformaram em uma abordagem de sustentabilidade que transcende a mera eficiência produtiva, culminando no SAFTA. Essa evolução demonstra como valores culturais centrais são dinamicamente moldados e refinados por pressões ambientais e econômicas, gerando soluções inovadoras.
A identidade nipo-brasileira de Tomé-Açu não é uma mera soma de elementos, mas uma co-criação dinâmica, onde as tradições japonesas se entrelaçam organicamente com a riqueza amazônica. Isso é visível na gastronomia única, com restaurantes que misturam sabores japoneses e ingredientes amazônicos. A comunidade mantém vivas suas tradições através de festivais, templos e a herança cultural da imigração japonesa. Eventos como a “Semana do Japão”, promovida anualmente pela Associação Pan-Amazônia Nipo-Brasileira (APANB), incluem oficinas de Yukata, Origami, Ikebana, Shodo e Soroban, além da apresentação do Bon-Odori, com crescente participação de residentes locais sem descendência japonesa. Outras associações também realizam Undôkai (gincanas esportivas), festivais de verão e culinária, e torneios de karaokê, reforçando a disseminação cultural.
A organização social da comunidade é um pilar fundamental para a manutenção de sua identidade e para o desenvolvimento contínuo. Além da CAMTA, que desempenha um papel central na economia, associações como a Associação Cultural de Tomé-Açu (ACTA) e a APANB são cruciais para a promoção da cultura e da educação. A ACTA, por exemplo, administra escolas de língua japonesa e a Escola Nikkei, a única escola particular de ensino fundamental e médio em Tomé-Açu, enquanto o Centro Educacional Kyoko Oti (CEKO) adota um sistema montessoriano e multilíngue com cursos de japonês. A arquitetura japonesa também se faz presente, com exemplos como a sede da CAMTA e o prédio da ACTA, que abriga um museu narrando a história da imigração japonesa no Pará.
O legado dos pioneiros é ativamente preservado e desenvolvido pela nova geração. Filhos e netos dos primeiros imigrantes eguiram os passos de seus antepassados, introduzindo e aprimorando os sistemas agroflorestais na região. Produtores como Alyson Inada e Jorge Itó, descendentes diretos, aderiram ao SAFTA nos anos 70, transformando suas propriedades em “mini florestas produtivas”. O interesse da nova geração em manter o legado é evidente na participação em cursos de fabricação de chocolate artesanal, com jovens como Nicole Sayuri Gomes expressando o desejo de dar continuidade à atividade de produção de cacau de suas famílias. A continuidade da cooperativa e o envolvimento ativo dos descendentes garantem que as lutas iniciais e as inovações conquistadas permaneçam relevantes, impulsionando o futuro da comunidade.
Tomé-Açu é hoje um modelo de desenvolvimento sustentável e de convivência harmoniosa com a floresta amazônica. A “sagacidade da comunidade japonesa em fazer bem o diferente” permanece como um traço distintivo. Figuras como o Embaixador do Japão no Brasil, Akira Yamada, visitam a região para reconhecer e fortalecer as relações, destacando a importância do SAFTA e o legado dos pioneiros. Além disso, líderes como Alfredo Kingo Oyama Homma e Dionísio Bentes foram cruciais na história da imigração e do desenvolvimento agrícola. Essa história de sucesso e integração é celebrada em eventos como os “90 Anos de Imigração Japonesa na Amazônia”, que valorizam a integração socioeconômico-cultural e a gratidão da comunidade nipo-brasileira.
VI. Conclusão: Uma História de Persistência, Inovação e Prosperidade
A jornada da imigração japonesa no estado do Pará, com Tomé-Açu como seu epicentro, é uma narrativa notável de persistência, inovação e prosperidade. Desde a chegada dos primeiros colonos em 1929, a comunidade nipo-brasileira enfrentou desafios monumentais, desde doenças tropicais e o fracasso de culturas iniciais até crises econômicas e preconceitos. Contudo, a capacidade de organização coletiva, a resiliência inabalável e a disposição para inovar foram os pilares que permitiram a superação dessas adversidades.
As contribuições dos imigrantes japoneses para o Pará são multifacetadas e profundas. No campo agrícola, a introdução e o sucesso da pimenta-do-reino transformaram a região, gerando riqueza e elevando o Brasil à liderança mundial na exportação do “diamante negro”. Mais significativamente, a crise da monocultura da pimenta-do-reino impulsionou a criação do Sistema Agroflorestal de Tomé-Açu (SAFTA), um modelo de agricultura sustentável que integra culturas frutíferas e florestais, garantindo a produção econômica em harmonia com a preservação ambiental. Esse modelo não apenas revolucionou a agricultura local, mas também se tornou uma referência acadêmica e prática para o desenvolvimento sustentável em toda a Amazônia. A experiência de Tomé-Açu transcende a história de uma única comunidade; ela se apresenta como um microcosmo do potencial de desenvolvimento sustentável para toda a Amazônia, demonstrando que a prosperidade econômica pode ser alcançada em harmonia com a preservação ambiental, desafiando os modelos extrativistas tradicionais.
Economicamente, a Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu (CAMTA) é um exemplo de sucesso, movimentando milhões de reais e gerando milhares de empregos, com sua agroindústria processando e exportando produtos de alta qualidade para o mercado global. Culturalmente, a comunidade nipo-brasileira de Tomé-Açu construiu uma identidade única, marcada pela fusão de tradições japonesas com elementos amazônicos, visível na gastronomia, nos festivais e nas associações que promovem a cultura e a educação. A identidade coletiva e o legado da comunidade são forças vivas que continuam a moldar as escolhas e aspirações das novas gerações, garantindo a relevância e o impacto contínuo do modelo de Tomé-Açu.
A história de Tomé-Açu é, em última análise, uma poderosa lição sobre a capacidade humana de adaptação e inovação. Ela demonstra que, mesmo diante das mais severas adversidades, a organização comunitária, a perseverança e a abertura para novas abordagens podem transformar desafios em oportunidades, criando um legado duradouro de prosperidade e sustentabilidade. Tomé-Açu não é apenas um ponto no mapa do Pará; é um farol que ilumina o caminho para um futuro onde o desenvolvimento econômico e a conservação ambiental caminham lado a lado, um verdadeiro legado do sol nascente na Amazônia.
Fontes